terça-feira, 30 de setembro de 2008

A chuva molha nossa cara

Como se a chuva não molhasse
ao cair em nossa cara,
como se não fosse verdade
tudo aquilo que sabemos,
como se o mundo fosse agradável
e as pessoas fossem boas,
como se a natureza
não fosse violenta,
como se a gente acreditasse
em todas as responsabilidades.

Assim, assim, assim.

Seria bom dizer não,
saber quando dizer sim
e ter um lugar seguro
pra se esconder quando cair a chuva,
e se abrigar dos trovões
com um chá quente,
um cobertor bem gostoso,
uma boa companhia.

É o que parece,
mesmo sem ver um outro mundo
lutamos pela vida
querendo desistir,
segurando com força,
como se a chuva não molhasse
quando a gente está lá fora
esperando ela chegar.

Campinas, 30 de setembro de 2008.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Pouco a pouco

Sabe que num dia desses
você começa a suportar
a voz um pouco alta,
e depois o grito.
Então você fica rouco,
tolera a tensão constante
e já não diz boa noite,
pois não podem ser boas
as noites de uma vida triste.
Em seguida vem o cansaço,
a insatisfação com cada coisa,
a depressão, o desespero,
e o tempo vai passando,
vai comendo a vida.
Até que você perceba
que lhe tiraram tudo
pouco a pouco
e agora, no fim
você já não é mais o mesmo.

Campinas, 19 de setembro de 2008

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Vala comum

As obras de Lorca
não podem estar completas.
Ontem eu te condenei
pelo que hoje eu mesmo fiz.
Na cova sem nome
as almas atiram seu ódio
e pás de cal alvíssimo
para apagar a memória.
Um conta-gotas
para encher o oceano
e a vida se esvai numa lágrima,
numa canção de amor.
Poderíamos enviar cartas
em branco
para que os outros pudessem
imaginar livremente
o que quisessem ler.
As palavras, a música,
o silêncio.
As obras de Lorca não podem estar completas.

Campinas, 16 de setembro de 2008.