sábado, 2 de maio de 2015

O governador se defende dos mestres

Um livro lido,
um punho erguido,
um coração pulsando
são armas de ataque.

As palavras ditas,
os gritos em coro,
as almas em uníssono
são armas de ataque.

A sequência caótica dos dias,
o amigo desistente,
a tristeza dolorida
são armas de ataque.

O roubo do futuro,
o ódio recebido,
o desrespeito
são armas de ataque.

O governador injustiçado
apenas se defende
dos mestres indignos.

Os policiais ameaçados
apenas se defendem
dos mestres violentos.


A bomba explode
obedecendo ordens de defesa.

A arma atira
obedecendo ordens de defesa.

O cão ataca
obedecendo ordens de defesa.

Todos se defendem
dos mestres-monstros
ameaçadores.

Bem defendidos todos,
aprovam o roubo
e celebram o esquecimento futuro.

Todos bem seguros,
garantida a ordem,
entrevista coletiva:
black blocks infiltrados,
tropa de choque com medo,
pequenos excessos
talvez investigados.

Na praça, na vida de verdade,
o sangue pulsa,
o sangue jorra,
mancha as camisas,
marca o chão.

Sangue das veias
de pessoas vivas,
não a tinta vergonhosa
da mentira sempre infame.

Vinte policiais feridos,
diz o governador
na realidade inventada
do mundo dos jornais.

Na praça, na vida de verdade,
o contador impreciso de feridos
apenas cresce:
cem, duzendos, trezentos...

O assessores sábios
apenas expressam
a alegria incontida.

Os mestres são culpados
antes de tudo
pelo ataque.

Somos nós os culpados
por nossas feridas
e pelo sangue no chão.

Duas bombas, uma arma,
valem mais que um professor.

Depois de tanto ódio
nosso lamento é coitadismo,
devemos retomar a ordem,
trabalhar por amor.


Não se pode atacar assim
a polícia, os deputados, o governador,
a injustiça não pode prosperar.

O correto é obedecer calado,
abaixar a vista,
aquietar o coração.


São metáforas apenas
a bomba de efeito moral,
o gás lacrimogênio,
as armas não letais.

O sangue
pulsa nas veias,
o coração apertado
às vezes explode.


O punho erguido
nem sempre aguenta.

Nesses tempos difíceis
tudo bem chorar.