sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Umas histórias


Quanto estava na estrada
andando pela América
descobrindo quem era
– ah, eu me lembro bem
da visão delirante da Patagônia
a chegada em Bariloche
o Nahuel Huapi impossível azul –
escrevi poemas ruins.

Escrevi poemas ruins
porque não sabia o que dizer.

Um hippie nos disse
– esqueci de contar
viajava com um amigo
hoje casou, dois filhos,
vive em Madison, Wisconsin,
conheceu a mulher no Chile,
depois de Bariloche,
de dormir na cordilheira e
um velhinho dizer
pra não fumarmos maconha
na caçamba fechada da sua caminhonete
com banquinhos de madeira adaptados,
vocês não vão entender, eu sei,
mas a gente nem fumava
era só barba, cabelo, sujeira –
mas o cara disse
que não tínhamos roupas
para aguentar o frio do inverno
não lembro se foi em Buenos Aires
ou depois de Algarrobo,
a capital nacional do alho
onde o Che Guevara
arrumou sua motocicleta,
ou da carona com Marisol
que não deu certo
e não chegamos a Choele Choel.

Eu casei, Marisol casou,
uma amiga de Las Grutas
agora vive em São Paulo.

Onde está o professor sulafricano
conversamos lá em Machu Picchu
eu subia sozinho
as picadas para Huayna Picchu
e não sei como
falamos sobre o Apartheid,
o Brasil é a África disfarçada
sem Desmond Tutu.

Onde estão Sandra, Etienne, Lucho?

Está bem, a Sandra está por aí,
nos falamos há alguns anos
e vi umas fotos suas no Facebook.

As amigas suecas
o futebol na Bolívia
– ah, trabalhei
porque o dinheiro acabou.

Karen, a feminista,
nos levou para conhecer Lima
quanto abrigos recebemos
quantos nomes esquecidos
quanta coisa persistente.

Fui ver a América
e encontrei.

Aí é assim
quando a gente
não sabe o que dizer
conta umas histórias
e vive a vida
o melhor que pode.

Goiás, 15 de fevereiro de 2013.

Caminhando

É como quando você se lembra
e vê a vida indo assim
passando como sempre
um filme na madrugada
solidão na quinta à noite
serei Cristo crucificado
ou Jesus com as crianças.

Meu pai tentava me ensinar a jogar bola
eu criança no parque Barigui
queria andar de rolemã
tinha medo do skate
achava patins coisa de playboy.

Sempre passo a mão nas folhas
quando vou banhar nos rios
lixeira, aveludadas, duras
aguentam todas o sol.

Às vezes de manhã
faço uma oração,
às vezes choro sozinho
e ninguém sabe,
o futebol me cansa
gosto dos livros
mas me cansam,
o pior é pensar num ateu
quando quer agradecer pela vida
e não tem com quem conversar.

Quem pode convencer um comunista
ou como mudar a mente de um liberal
ou será meu-deus-do-céu
que o mundo vai ser diferente...

Esperamos
enquanto isso
vamos caminhando.

Goiás, 15 de fevereiro de 2013.