sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Meu vizinho Eichmann

É claro que enche o saco

quando a gente se lembra

do passado e diz assim

eu já falava, anos atrás.


Mas o problema grave,

isso é verdade!

desde aquela época

do gigante acordou

quando os amarelinhos

dominaram de ver a cena

toda.


O amigo acusava fascistas

e eu lhe dizia exagerado

e rabugento

e ele ralhava e ressentia

da minha palavra analítica.


A menina tinha pegado

o caco de vidro no chão

pra ninguém pisar

no meio daquelas bombas

ele cantou.


Dias e bombas depois

muito tempo no absurdo

pegajoso

felicitamos um ao outro

na tristeza.


Em casa em desespero

acertamos anos atrás

- eu avisei a chatice

insuportável.


Era mesmo a desgraça

do fascismo

como ele dizia

e tão banalizado

como eu criticava.


A Hannah precisava

escrever outro livro

pra julgar o Eichmann

dono da oficina

aqui perto de casa.


Precisava mas não vai

e sobrou tudo pra nós

uma gente meio mole

dormindo de olho aberto.


Sobrou tudo pra nós

agora

agora mesmo.


Vamos reler

a Hannah

e o Primo Levi

e o Maus

e vamos ler os poemas novos

e o velho evangelho

pra ver se a gente

vira umas mesas

e aprende algo sobre amor

e dor e morte e perdão

pra ver se a gente

ressuscita.


6/7/2020

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