domingo, 21 de junho de 2020

Não aqui


O desespero dos dias é a nova forma de existir.
Contamos os mortos sem estar em guerra,
a cada dia morremos de medo e de vergonha
porque nunca vimos tanta insensatez.

Conhecemos a loucura, todos nós que fomos jovens e sofremos.
Essa dose, esse nível, ao mesmo tempo,
faz corar até o revolucionário mais niilista
e todos nós sabemos que niilistas não coram, mas se irritam.

Todos nós, minimamente sensatos
(ou estamos loucos e não sabemos)
não fomos – totalmente – pervertidos pelo ódio,
mas os dias nos ensinam a odiar.

Não poderemos resistir sem raiva, parece,
e odiaremos o ódio com todas as forças,
o ódio presente, o sangue presente,
a vida presente, os olhos vermelhos.

A vida é prematura,
o ano nasceu sem esperanças,
queremos ir embora
antes que a tudo vire amargo.

A vida em desespero é pegajosa.
Não sei se vamos juntos
de mãos dadas e abraçados,
cantando ou em silêncio.

Já não nutro tantas esperanças.
Talvez devesse, mas não posso.
Este ano é sujo, oleoso
e já nasceu velho.

O que pensam os jovens antes de dormir…
Eu penso em sonhos e na vida presente,
no futuro passado.

Amanhã o sol nasce,
é domingo,
haverá festa em algum lugar.
Não aqui.

20 de junho de 2020.

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